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domingo, 10 de junho de 2012

O Brasil precisa de mais médicos


Por Joaquim Maia Neto

O Governo Federal acaba de anunciar um plano para aumentar em 15% o número de vagas em cursos de medicina no país. Serão criadas 2415 novas vagas, sendo dois terços delas em universidades federais e um terço na rede privada. Esta ação governamental visa reduzir a carência de médicos, aproximando a relação médico/habitante àquelas de países que se encontram em situação bem melhor que a do Brasil.

Apesar de louvável, a atitude do governo sofreu severas críticas do Conselho Federal de Medicina (CFM). Para o CFM o aumento do número de vagas não representará melhoria na qualidade do atendimento à saúde da população. O conselho teme que a expansão do ensino de medicina implique a redução da qualidade dos cursos. Para o CFM não faltam médicos no Brasil, mas há problemas na distribuição desses profissionais pelo país devido à falta de incentivo e de condições de trabalho em regiões menos desenvolvidas.

Fonte: http://fernandageri.blogspot.com.br
Tanto o CFM como a imensa maioria dos Conselhos Regionais de Medicina combatem há muitos anos as políticas públicas de fomento e autorização de ampliação no número de vagas e de criação novos cursos. Os argumentos da classe médica utilizados como justificativa a esta oposição são frágeis e parecem ter motivações corporativistas contrárias ao interesse público.

Não se tem notícia de que o aumento no número de engenheiros tenha reduzido a qualidade das obras no Brasil, ou que a ampliação das vagas em cursos de publicidade tenha comprometido a qualidade dos anúncios publicitários. Da mesma forma não será a expansão dos cursos de medicina que fará a saúde do brasileiro piorar.

Entre os argumentos do CFM, talvez o mais frágil seja o de que não faltam médicos no país. Mesmo nas capitais mais desenvolvidas e nas cidades brasileiras com maior IDH é comum haver reclamações generalizadas sobre a falta de médicos. O problema não se restringe à rede pública. Usuários de planos de saúde já estão acostumados às longas filas de espera para consultas em muitas especialidades. Para algumas, três meses já é considerado um tempo “normal” para se agendar o atendimento. Mas não é apenas a observação empírica que derruba o argumento do suposto número adequado de profissionais. Se no Brasil há profissionais em número suficiente, estariam os demais países exagerando na formação de seus médicos, desperdiçando recursos importantes em cursos que formam profissionais desnecessários? Dados da OCDE e da OMS demonstram que o Brasil está muito aquém até mesmo de países economicamente menos desenvolvidos. Aqui o número de médicos por 1000 habitantes é 1,8. Esse número é maior em países como Cuba (6,4), Grécia (5,4), Rússia (4,4), Bélgica (4), Espanha (3,7), Uruguai (3,7), Israel (3,6), Portugal (3,5), Argentina (3,1), Austrália (2,8), EUA (2,4), Japão (2,1) e México (2).

O plano do Governo ataca também a distribuição dos médicos no país, uma vez que a maioria das vagas a serem criadas será nas regiões norte e nordeste. Claro que não é o simples aumento do número de vagas que irá garantir melhoria no sistema de saúde. Tampouco essa expansão de oferta está necessariamente atrelada à queda na qualidade. Os Ministérios da Educação e da Saúde devem exercer sua responsabilidade na avaliação dos cursos e do sistema. A criação de cursos e o aumento de vagas passam pelo crivo dos conselhos nacionais de educação e de saúde. Ao invés de reclamar e querer garantir reserva de mercado aos profissionais em atuação o CFM deveria se preocupar em fiscalizar o exercício profissional dos médicos.

Infelizmente são cada vez mais comuns as atitudes questionáveis do ponto de vista ético praticadas por médicos. Não podemos generalizar, pois há muitos profissionais altamente comprometidos com sua profissão, mas são muitos os motivos de reclamação por parte dos usuários dos serviços de saúde. Médicos consagrados recusam novos pacientes porque já têm uma carteira rentável de clientes. Outros cobram “por fora” dos usuários de planos de saúde por procedimentos mais complexos. Muitos médicos se recusam a fazer partos normais para não “perderem” tempo. Há vários exemplos de servidores médicos que não cumprem sua jornada na rede pública para privilegiar o atendimento em seus consultórios privados. O combate a estes problemas por parte do CFM é muito mais efetivo na melhoria do atendimento à saúde do que o combate à expansão das vagas. Má qualidade na formação dos profissionais se resolve com uma boa regulação das instituições de ensino, focada em avaliação e fiscalização.

A atitude do CFM é típica de uma classe que, apesar de estar se modernizando rapidamente, adaptando-se à nova realidade social, ainda é bastante influenciada por uma visão elitista que permeia a profissão. Muitos médicos ainda se consideram mais importantes do que os demais profissionais. Isso acaba pautando a atuação dos conselhos de medicina. Até há pouco tempo médicos poderiam acumular cargos públicos enquanto outros profissionais da saúde não. Suas jornadas de trabalho são reduzidas. Em geral ganham mais do que outros profissionais de formação acadêmica equivalente. Insistem em ser chamados de “doutores” quando têm apenas graduação, apegando-se a uma tradição há muito ultrapassada. O profissional médico é fundamental para a sociedade e isso deve ser levado em conta na valorização de sua profissão. Mas não há motivo para que um médico seja mais valorizado do que um professor em termos de status, remuneração ou privilégios.

As ações divulgadas pelo Governo para aumentar o número de médicos no país, atreladas a um bom controle da qualidade dos cursos, além de atender a uma necessidade da população, terão efeitos positivos na própria valorização da profissão de médico. Novos profissionais oxigenarão o setor. Com mais vagas, haverá maior acesso de camadas menos abastadas da sociedade. Isso contribuirá para “deselitizar” a profissão e fará com que a população seja melhor atendida em suas demandas. O MEC está de parabéns ao enfrentar as resistências. O tempo mostrará que essa é uma atitude correta.

Um comentário:

  1. Boa noite Joaquim Maia Neto!

    Sinceramente falando, tenho imenso prazer em ler os seus posts, pois você relata sobre os principais problemas da sociedade através de textos eximiamente escritos e bem pensados. Este que acabei de ler por exemplo, discorre sobre um assunto de suma importância para a sociedade brasileira, e demonstra insatisfações que não são só suas, mas de todos os cidadãos brasileiros, que há muito já estão saturados com a lastimável situação da saúde da população do Brasil.

    Concordo sem tirar nem por, com cada uma das suas palavras, pontos e vírgulas.

    É muito bom saber que existem outras pessoas além de mim, na sociedade brasileira que não estão satisfeitas com a sua estrutura e com muitos de seus polêmicos aspectos.

    Atenciosamente,
    Icaro Henrtique.

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