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domingo, 19 de agosto de 2012

Cadê a logística reversa das lâmpadas?

Por Joaquim Maia Neto

Passados dois anos da publicação da Lei 12305/2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, duas pendências incomodam bastante. A primeira delas refere-se ao prazo para a elaboração dos planos estaduais de resíduos sólidos e dos planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos, vencido no último dia 2 de agosto. Há indícios de que a grande maioria dos estados e municípios não cumpriu com essa obrigação legal, o que pode comprometer seriamente a implementação da política. A segunda grande pendência é relativa à logística reversa de lâmpadas.

A Lei estabeleceu a obrigação de se estruturar sistemas de retorno de alguns produtos, após o uso pelo consumidor, aos comerciantes, distribuidores, importadores e fabricantes, para que seja dada a destinação adequada a fim de se mitigar os danos causados ao meio ambiente. As categorias de produtos abrangidos pela obrigatoriedade de implementação do sistema de logística reversa são: agrotóxicos, seus resíduos e embalagens; pilhas e baterias; pneus; óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens; lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista, e; produtos eletroeletrônicos e seus componentes.

Quase todas as categorias de produtos abrangidas pela Lei já dispõem de sistemas mais ou menos implementados de logística reversa. Hoje em dia o consumidor consegue com certa facilidade devolver os produtos ao revendedor, de forma que eles retornem ao fabricante para o reaproveitamento dos materiais ou a disposição correta. A exceção são as lâmpadas.

É assustador constatar que a imensa maioria das lâmpadas fluorescentes descartadas no Brasil tem destino inadequado. Esse tipo de produto pode ser considerado como um resíduo perigoso, devido à presença de substâncias tóxicas em seu interior, como o mercúrio. São comercializadas por ano no país cerca de 250 milhões de lâmpadas fluorescentes, mas apenas 14 milhões de unidades são recebidas para um descarte adequado, que envolve a descontaminação e o reaproveitamento das substâncias perigosas. Em geral as lâmpadas queimadas são jogadas no lixo comum e acabam contaminando o meio ambiente e colocando em risco a saúde das pessoas.

Existem empresas especializadas na descontaminação, reciclagem e reaproveitamento de materiais das lâmpadas fluorescentes, mas normalmente apenas grandes empresas, que consomem muitas lâmpadas, pagam por estes serviços. O consumidor, mesmo quando consciente, tem grandes dificuldades em dar destino às lâmpadas que descarta ao final da vida útil do produto. Os elos da cadeia produtiva que lucram com a fabricação e venda de lâmpadas fluorescentes continuam se omitindo acerca da responsabilidade de recolher o produto após o seu ciclo de vida.

No mês passado o governo lançou, tardiamente, um edital convocatório para que a cadeia produtiva das lâmpadas promova um acordo setorial com a finalidade de viabilizar a implantação da logística reversa. As empresas têm 120 dias, contados da publicação do edital, para apresentar as propostas que serão analisadas pelo governo. A letargia do setor não se justifica, a não ser pelo fato de que os empresários reproduzem a lógica de obter o máximo lucro com o mínimo investimento ambiental, transferindo o custo das externalidades negativas de sua atividade para toda a sociedade. O setor de eletroeletrônicos, também não firmou acordo setorial, mas tem recebido dos consumidores os produtos usados para destinação correta, agindo assim de maneira mais responsável do que os fabricantes de lâmpadas.

Enquanto o acordo setorial não sai, assistimos ao absurdo de encontrar lâmpadas extremamente perigosas jogadas no lixo comum. O próprio poder público, em especial a União, que é grande consumidor de lâmpadas, não dá um bom exemplo. Geralmente as entidades públicas não pagam pelos serviços de destinação adequada de lâmpadas queimadas e as descartam irresponsavelmente.

Além de pressionar governo e empresas para resolverem o problema, devemos procurar ter atitudes responsáveis com os nossos resíduos. O jeito é armazenar as lâmpadas até que o sistema de logística reversa seja implementado. Há empresas que, mesmo sem ter a obrigação, prestam relevantes serviços, como política de responsabilidade socioambiental. O Shopping Center Pátio Brasil, de Brasília, dispõe de um ecoponto que recebe no último final de semana de cada mês, gratuitamente, lâmpadas queimadas de toda a população para destinação correta, arcando com os custos desse procedimento. É uma bela iniciativa que hoje se constitui na única opção responsável que os consumidores de lâmpadas de Brasília têm para efetuar o descarte correto.

domingo, 12 de agosto de 2012

Mais uma eleição

Por Joaquim Maia Neto

Com o início das campanhas eleitorais nos municípios os eleitores se deparam novamente com a difícil missão de escolher seus representantes no poder legislativo, bem como a pessoa que irá administrar a cidade durante os próximos quatro anos. A cada dois anos os brasileiros são chamados às urnas, com exceção dos eleitores domiciliados no Distrito Federal, onde não há municípios e, portanto, as eleições ocorrem apenas a cada quatro anos. 
Os recorrentes escândalos têm levado as pessoas a cultivarem um grande descrédito com relação à política, o que é muito ruim para a democracia. Muita gente, talvez a maioria dos eleitores, acredita que quem se candidata a um cargo público está cheio de “segundas intenções”. O real interesse dos candidatos não seria a vontade de trabalhar em benefício da coletividade, mas sim a oportunidade de se utilizar do cargo eletivo para obter vantagens para si e para seus familiares, visando o enriquecimento rápido e fácil. A crença no fato de que não há políticos honestos leva os eleitores a dois tipos de comportamento que, apesar de distintos, são igualmente nocivos na medida em que perpetuam a permanência de uma maioria de políticos desonestos nos cargos públicos. Um dos comportamentos comuns diante da constatação do predomínio da desonestidade na política é a alienação. As pessoas se “enojam” com tantas falcatruas e passam a desprezar a atividade política. Deixam de se informar e acabam deixando para escolher o candidato apenas por obrigação, sem muito critério. Em muitas das vezes a opção acaba sendo o voto nulo ou branco. Outro comportamento comum do eleitor frente à realidade na qual a ética é exceção na política, é agir da mesma maneira que os políticos, buscando obter vantagens em troca do voto. Essas vantagens podem ser imediatas ou futuras. O eleitor que age assim torna-se cúmplice do político desonesto.

Apesar de ser mais grave, o segundo tipo de comportamento tem os mesmos efeitos práticos que o primeiro. Quem despreza a política devido aos desmandos existentes é tão útil ao sistema quanto aqueles que contribuem ativamente com a corrupção. Políticos corruptos vivem da conivência de eleitores de mesma índole assim como da omissão dos que não concordam com atitudes antiéticas.

Há algumas maneiras de separar o joio do trigo, mesmo que haja pouco trigo. Um bom começo é escolher o candidato pelas suas propostas. Ao invés de votar naquele que promete um favor pessoal, deve-se optar por aquele que tenha um projeto coletivo que se identifique com aquilo que o eleitor defende. Se eu sou defensor do meio ambiente, devo procurar candidatos que tenham a causa ambiental entre suas propostas. Mas apenas as propostas não bastam. É preciso verificar as ações do candidato no passado. Será que a prática anterior do pleiteante ao cargo eletivo é coerente com sua plataforma eleitoral? Será que suas ações estão de acordo com o que eu espero de um político? O cuidado deve ser redobrado no caso de candidatos que buscam a reeleição. Um mandato anterior traz muitos subsídios para uma avaliação do político. Se todos os que já tiveram mandato pisaram na bola, talvez seja o caso de dar chance a um estreante. Nesse caso vale a regra de que todos são inocentes até que se prove o contrário. A escolha de candidatos “ficha-limpa” está ao alcance do eleitor, ainda que a justiça não seja eficaz nisso.

Quem são os aliados de quem eu penso em eleger? Um político não pode fazer boas coisas se estiver comprometido com quem não presta. Não adianta querer ser um bom vereador estando preso a compromissos com um candidato a prefeito corrupto ou sendo financiado por empresas que têm interesses escusos junto à administração. Não se pode agradar a Deus e ao diabo ao mesmo tempo.

Há ainda dois critérios fundamentais para uma boa escolha. O primeiro diz respeito ao custo da campanha. Campanhas caras não são bom sinal. Quem gasta demais invariavelmente tenta recuperar as despesas utilizando-se para isso do cargo público ou fica com o rabo preso com quem o financiou. O outro critério aplica-se a quem já exerceu cargo público e refere-se à evolução patrimonial do candidato. Quem fica rico após entrar para a política é suspeito de antemão. Nenhum salário de cargo eletivo é suficiente para enriquecer seu ocupante. Bons políticos saem do mandato da mesma forma em que entraram.

Muitas vezes a sociedade é iludida pela hipocrisia dos meios de comunicação de massa que criticam o pagamento de salários dignos aos ocupantes de cargo eletivo, mas não atacam os meios escondidos de subsistência dos políticos. Normalmente os candidatos não trocam suas atividades profissionais pelo mandato caso isso implique redução substancial de suas remunerações. Quando o fazem, eles buscam uma compensação “por fora”, o que muitas vezes os amarram a compromissos contrários ao interesse público. Seria justo que um prefeito, governador, presidente ou parlamentar ganhasse, para exercer seu mandato, o mesmo que ganha em sua profissão de origem, tendo as despesas do exercício da atividade bancadas pelo poder público, limitadas a um patamar razoável previamente determinado.

Política não pode ser profissão. Deveria ser entendida como uma das mais nobres maneiras de servir ao semelhante e à comunidade. Ao contrário, muitos enxergam nela a oportunidade de se locupletar com o dinheiro público. Fazem da política um negócio e isso deve ser combatido, sobretudo pelo eleitor.

O eleitor deve ter em mente, quando da escolha de seus candidatos, que eleição não é aposta nem campeonato de futebol. Não devemos ter a preocupação de “ganhar”. Se o candidato que mais atende aos critérios que elegemos para fazer nossa escolha não for favorito, ou ainda não tiver sequer a chance de ganhar, isso não importa. O que importa é que votemos naquele que consideramos o melhor, o mais preparado, mais honesto e mais ético. Voto útil é aquele dado a quem realmente merece. Optar entre dois ruins só para impedir que o “pior” vença é algo que nunca dá certo. Essa prática faz com que elejamos alguém que não é o melhor e desestimula a iniciativa de pessoas idealistas. A exceção existe apenas no caso de segundo turno.

É preciso saber que mesmo que não gostemos de política e ainda que a ignoremos, teremos nossas vidas bastante afetadas pelas decisões tomadas pelos políticos. Assim, o mínimo que temos que fazer é avaliar bem os candidatos que disputam os pleitos nos locais em que moramos. É possível que não haja candidatos sérios à disposição da sociedade. Caso essa seja a constatação do eleitor, é bom lembrar que sempre temos a opção de participar da vida política, colocando nosso compromisso ético a serviço da coletividade. É uma escolha interessante para quando acharmos que não há outra.

domingo, 5 de agosto de 2012

A irresponsabilidade de um governo que maltrata seus servidores

Por Joaquim Maia Neto

A crise econômica de 2008 que quase quebrou a economia mundial foi importante para mostrar ao mundo a necessidade de se ter estados fortes. O modelo neoliberal baseado no estado mínimo e na auto-regulação dos mercados demonstrou sua fragilidade e incapacidade de garantir o bem estar geral da sociedade.

Ocorre que a premissa básica para a manutenção de um estado forte e de uma boa regulação é a existência de servidores públicos capacitados, motivados e bem remunerados. Apesar do preconceito ainda existente em relação aos servidores públicos, advindo de uma época em que predominava o modelo de administração burocrática no serviço público, a realidade atual na administração pública federal é a de um crescente modelo gerencial, focado na eficácia das ações, no alcance de resultados e na meritocracia. O perfil do servidor mudou substancialmente nas últimas duas décadas. A profissionalização alcançou níveis bastante satisfatórios. Os concursos públicos tornaram-se extremamente exigentes e concorridos e passaram a selecionar quadros altamente capacitados, que têm feito a diferença em termos de melhoria dos serviços e de desempenho gerencial.

A notória profissionalização existente hoje na máquina pública federal tem levado milhares de pessoas a investirem nas carreiras de estado. A capacitação profissional tem acontecido antes mesmo do ingresso na carreira pública, como forma de preparação para os exigentes processos seletivos.

Embora se observe que o atual governo federal se pauta por uma forte e necessária presença estatal na economia, mais como regulador do que executor, causa estranheza a maneira injusta e irresponsável com que a presidente Dilma Rousseff vem tratando aqueles que seriam seus principais colaboradores na implementação das políticas públicas da União: os servidores públicos.

O governo tem se utilizado dos meios de comunicação para colocar a opinião pública contra os servidores. Aliando-se a setores econômicos que apenas almejam a transferência de recursos públicos aos seus negócios privados, na forma de incentivos fiscais, contratos públicos, empréstimos subsidiados, entre outros, o Planalto planta notícias que alardeiam supostos privilégios abusivos usufruídos pelos servidores. Situações raras que configuram exceções são tratadas como regra, numa clara manipulação de informações que tem como objetivo desmerecer a importância de milhares de trabalhadores que optaram pelo nobre ofício de servir ao povo, desempenhando atividades que ao invés de visar lucro, visam o atendimento das necessidades coletivas.

Em suas ações manipuladoras da informação, governo e mídia omitem importantes desvantagens as quais estão sujeitos os servidores públicos quando comparados aos trabalhadores da iniciativa privada. No serviço público não há a liberdade de se negociar salário entre trabalhadores e empregadores, como há na iniciativa privada. Até mesmo a reposição de perdas inflacionárias depende de aprovação legislativa. Na União os servidores não têm database. Enquanto trabalhadores celetistas são beneficiados com dissídios anuais que recompõem o poder de compra dos salários e muitas vezes conferem ganho real, servidores públicos ficam anos sem qualquer reajuste, tendo sua remuneração corroída pela inflação. Grande parte da população que se revolta quando vê servidores fazendo greve para pedir “aumento” salarial de 20 ou 30 % não sabe que não se trata de aumento, mas sim de reposição inflacionária acumulada, em alguns casos ao longo de quatro ou cinco anos de reajuste zero.

Uma falácia largamente propagada pelo governo e pela imprensa é a de que a média salarial do serviço público é superior à da iniciativa privada. Os números são comparados levando-se em conta toda a massa salarial de ambos os setores, o que causa distorções expressivas. Não se pode comparar o conjunto dos salários da iniciativa privada, que inclui trabalhadores que desenvolvem atividades de menor complexidade, como limpeza, vigilância, condução de veículos, entre outras, com a massa salarial do setor público, que hoje é restrita aos trabalhadores da atividade fim da administração, uma vez que as atividades de apoio são terceirizadas no serviço público. Quando se comparam as funções técnicas, de gestão e executivas, a média da iniciativa privada é superior. 

Foto: Sinagências

Neste momento cerca de 30 categorias de servidores públicos federais estão em greve, incluindo professores universitários, policiais, trabalhadores de agências reguladoras, do INCRA, do DNPM, entre outros. Cerca de 350 mil servidores estão paralisados, exigindo que o governo negocie com as categorias. A greve, que já é praticamente uma greve geral, só aconteceu devido à truculência com que os servidores vêm sendo tratados pela administração. À exceção dos professores, não foi sequer apresentada contraproposta aos pleitos, apresentados em alguns casos há anos.

Enquanto o governo diz que não pode atender aos servidores devido à crise, como se salário não reforçasse a economia, concede isenções tributárias a multinacionais que não têm qualquer compromisso com a manutenção de empregos. A General Motors, por exemplo, depois de extremamente beneficiada com a isenção de IPI que reduz a quantidade de dinheiro que poderia ser aplicado em investimento social, resolveu demitir milhares de trabalhadores de suas fábricas no Brasil, com o único propósito de manter seus altos lucros, que aqui são maiores do que em qualquer outro país do mundo.

Os servidores não podem deixar de lutar para manter condições dignas de trabalho e de sobrevivência. Mesmo as carreiras bem remuneradas não devem abster-se de combater a progressiva erosão salarial. Há exemplos de carreiras, como a dos servidores do judiciário, que já foram extremamente atrativas, mas que ao longo de anos de ausência de correção tiveram sua remuneração achatada e hoje perdem quadros que consumiram anos de investimento em capacitação, o que leva à queda da qualidade dos serviços prestados à sociedade. Quando os servidores fazem greve pela manutenção das condições de trabalho e de remuneração, não estão lutando apenas por seus direitos individuais, mas pelas instituições em que trabalham e consequentemente pelo interesse público.

Ao invés de negociar com os servidores, como se espera em um regime democrático, Dilma prefere atacar as instituições que empregam quem está em greve, esvaziando suas atribuições. No mês passado a presidente publicou o Decreto 7777/2012, determinado que as entidades da administração pública federal cujos servidores estejam em greve, transfiram, mediante convênio, a execução de suas atribuições aos estados e municípios. O decreto determina ainda a adoção de procedimentos simplificados durante a greve e foi utilizado, por exemplo, para reduzir as filas de navios nos portos, causadas pela paralisação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. A irresponsabilidade do governo foi tão longe a ponto de a ANVISA, para atender ao decreto, liberar o descarregamento de navios provenientes do exterior sem a inspeção necessária, colocando o Brasil em alto risco sanitário. De acordo com especialistas da Agência, esse procedimento aumenta em muito a probabilidade de introdução no país de doenças causadas por microorganismos, como as gripes suína e aviária, entre outras.

Transferir atribuições de instituições federais altamente especializadas para estados onde não há servidores capacitados para o desempenho dessas atribuições e onde há forte pressão política para burlar procedimentos necessários ao cumprimento da legislação é uma atitude irracional que custará muito mais caro ao país do que o atendimento a pelo menos parte das reivindicações justas dos trabalhadores do poder público federal.

Irracional também é a reprodução exaustiva do discurso da crise que causa receio nos mercados, inibindo investidores, o que apenas serve para estimular uma verdadeira crise devido ao efeito psicológico das afirmações catastróficas do governo. Muito mais inteligentes do que a postura do governo Dilma, eram as afirmações do ex-presidente Lula que, diante das ameaças de crises internacionais, afirmava que no Brasil não passariam de “marolas” que seriam superadas com facilidade. O discurso otimista do ex-presidente tranquilizou o mercado e acabou afastando a crise para longe do Brasil. Os investimentos permaneceram, inclusive os públicos. As negociações com os servidores prosperaram e os salários aqueceram a economia. Ao contrário, o atual governo, de tanto falar em crise, fará com que todos acreditem nela, levando o país a um tsunami cuja responsabilidade será da Presidente da República.

Já é hora de perceber que o perfil centralizador e autoritário de Dilma está anulando todos os avanços conquistados ao longo dos últimos anos. Qualquer empresa privada sabe que não alcança resultados satisfatórios se não tiver colaboradores minimamente satisfeitos. Na administração pública não é diferente. Será que a presidente acha que fará um bom governo batendo de frente com a força de trabalho de que dispõe para governar?

domingo, 29 de julho de 2012

A Lua só brilha porque existe o Sol


Por Joaquim Maia Neto

“A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las” - Aristóteles

A reação do governo brasileiro à participação de Marina Silva na abertura dos Jogos Olímpicos de Londres é digna não apenas de indignação, mas também de preocupação por parte de quem defende a democracia.

Marina Silva conduz a bandeira olímpica, junto com
Muhammad Ali, Ban Ki-moon e demais homenageados
Foto: Jonne Roriz/AE
A ex-senadora e ex-ministra do meio ambiente do Brasil foi escolhida pelo Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Londres para carregar a bandeira olímpica durante a cerimônia inaugural, juntamente com outras sete personalidades reconhecidas internacionalmente pelo seu engajamento em causas humanitárias. Além de Marina, tiveram a honra de desfilar conduzindo o estandarte olímpico o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, o maestro argentino Daniel Barenboim, o maratonista etíope Haile Gebrselassie, a ativista liberiana Leymah Gbowee e as defensoras dos direitos civis britânicas, Doreen Lawrence, Sally Becker e Shami Chakrabati. Também foi homenageado durante a cerimônia o pugilista estadunidense Muhammad Ali.

A participação de Marina Silva na cerimônia olímpica foi uma surpresa, uma vez que os organizadores pediram sigilo aos convidados. Ao ver uma brasileira aparecendo mais do que a presidente do Brasil, Dilma não gostou. É claro que Dilma não manifestou por si mesma o seu descontentamento. O inconformismo presidencial foi exposto indiretamente por meio de declarações de ministros, deputados e outros membros da comitiva brasileira, que se solidarizaram ao despeito da presidente. O ressentimento não foi causado apenas porque outra brasileira teria ofuscado a mais alta mandatária do país, mas porque a presidente nutre antipatia pela homenageada desde que foram colegas de ministério durante o governo Lula.

À frente do Ministério das Minas e Energia e da Chefia da Casa Civil da Presidência da República, Dilma fez tudo o que pôde para impedir que Marina executasse seus projetos no Ministério do Meio Ambiente, até que a situação chegasse ao limite, levando ao pedido de demissão da ex-senadora. A participação de Marina nas eleições presidenciais com razoável desempenho acabou levando o pleito ao segundo turno, o que teria sido motivo para ampliar a animosidade de Dilma contra Marina.

A manifestação mais ressentida veio do ministro Aldo Rebelo. Mentor do desmonte do Código Florestal Brasileiro, o comunista aclamado pelos capitalistas selvagens por seus grandiosos serviços prestados aos latifundiários brasileiros e às multinacionais do agronegócio declarou ironicamente que “Marina sempre teve boa relação com as casas reais da Europa e com a aristocracia européia”, como se a escolha das personalidades tivesse sido feita pela nobreza britânica com a finalidade de desafiar a presidente brasileira.

As personalidades homenageadas, entre elas Marina Silva, tiveram mais destaque do que todos os chefes de estado, com exceção da Rainha Elizabeth II, devido ao reconhecimento internacional alcançado pelos seus trabalhos. Ao invés de fomentar a teoria da conspiração contra o governo do Brasil, a presidente e seus ministros deveriam, além de reconhecer a importância de Marina Silva na história do ambientalismo mundial, a exemplo do que foi feito pelo Comitê Olímpico Internacional, orgulharem-se pelo fato de haver uma brasileira entre o seletíssimo grupo de figuras mundiais ilustres. Cairia muito melhor à presidente fazer coro às homenagens, dando destaque ao fato de haver na abertura dos jogos duas brasileiras de renome, Marina e a própria Dilma, a primeira mulher eleita presidente do Brasil. Dilma abdicou de uma nobre postura de estadista ao se ressentir e permitir que seus auxiliares falassem as bobagens que falaram. Na figura de Marina era o Brasil quem estava representado, reconhecido pelos esforços em busca de um mundo mais sustentável, justo e ambientalmente equilibrado. É preciso separar as coisas. Durante a cerimônia, metade da população mundial aplaudia Marina Silva, junto com os demais homenageados, enquanto ambientalista renomada e não enquanto opositora do atual governo brasileiro. Dilma, ao contrário do mundo, torceu o nariz, inebriada por sua vaidade.

Já é tempo de os políticos brasileiros entenderem que respeito e autoridade não são qualidades que estão automaticamente associadas com os cargos que ocupam. Essas qualidades são frutos de trabalho coerente. Lamentavelmente ainda padecemos, no Brasil, de certo complexo de inferioridade que faz com que tenhamos desconfiança toda vez que um brasileiro se destaca no cenário político internacional. Enquanto o mundo homenageia nossos brilhantes compatriotas, insistimos em tecer críticas descabidas ao invés de procurarmos nos informar sobre o trabalho que mereceu tamanho destaque e honrarias. Curioso é notar que o despeito que ora motiva as críticas do governo petista da presidente Dilma contra Marina e os organizadores das olimpíadas, é o mesmo que aflige os setores reacionários da sociedade brasileira e que até hoje vitima o ex-presidente Lula quando do reconhecimento internacional de seus feitos. A sucessora de Lula usa do mesmo veneno usado por muitos de seus opositores para desmerecer o trabalho reconhecido do ex-presidente.

Dilma Rousseff jamais brilhará como estadista enquanto continuar tentando ofuscar o brilho de brasileiros que se destacam no cenário internacional, apenas porque estão na oposição ao seu governo, ou porque divergem de suas políticas setoriais. Chefes de Estado são como a Lua. Seu brilho é reflexo do Sol, representado pela sociedade, seus líderes e seus cidadãos de destaque. Sem esse Sol a Lua permanecerá na sombra, sem se destacar e sem cumprir plenamente seu propósito enquanto astro que ilumina a noite.

domingo, 22 de julho de 2012

Do cocô das andorinhas à prisão das capivaras




Por Joaquim Maia Neto

Apesar do notório aumento da preocupação da sociedade com questões ambientais, incluindo a proteção da fauna silvestre e o bem-estar animal, ainda há um longo caminho a percorrer no que diz respeito à convivência harmoniosa entre o homem e a natureza, em particular o convívio com os animais.


A recente polêmica acerca das capivaras do Parque da Represa Municipal de São José do Rio Preto ilustra bem a dificuldade que tem o ser humano, em especial o poder público, em lidar com a questão. A represa é considerada o cartão postal da cidade. A população de capivaras que habita o local há muito tempo faz parte da paisagem, tornando-se uma atração bastante procurada e apreciada por moradores locais e turistas. Há poucos dias a administração municipal começou a instalar cercas às margens do espelho d’água, em alguns trechos a menos de um metro, com o intuito de confinar os animais, sob o argumento de que a medida iria protegê-los contra acidentes de trânsito causados quando as capivaras transitam pela via pública que margeia o lago.

A motivação aparentemente nobre para o cercamento das capivaras esconde um comportamento intolerante e demonstra a prioridade equivocada de quem faz a gestão ambiental do município. A história recente de Rio Preto mostra o despreparo de muitos administradores públicos para lidar com questões ambientais. Em 1972 o então prefeito Adail Vetorazzo determinou que servidores municipais queimassem as andorinhas com tochas em pontas de varas de bambu para que as aves deixassem de defecar nos veículos estacionados na Praça Dom José Marcondes. Embora os milhares de andorinhas que migravam do hemisfério norte para Rio Preto proporcionassem um belíssimo espetáculo com suas revoadas de final de tarde no centro da cidade, muitas outras tentativas de espantá-las foram levadas a cabo pelo poder público municipal, passando pelo barulho de rojões até o corte arbitrário de árvores que serviam de local de pouso para as aves. Hoje as andorinhas já não aparecem em Rio Preto e assim os veículos e praças estão a salvo do cocô dos belos animais. A população não pode mais contemplar o show da natureza que encantou gerações de riopretenses.

Voltando às capivaras, é lamentável que a represa seja cercada do modo como a secretaria do meio ambiente está fazendo. Em 2005 os roedores foram alvo de outra polêmica. A secretaria do meio ambiente, à época administrada pelo mesmo secretário de agora, estudava retirar as capivaras da represa, sob o pretexto de que havia uma superpopulação que colocava as pessoas sob risco de febre maculosa. Técnicos do IBAMA e da UNIRP, além de representantes da Polícia Ambiental, estudaram a questão concluindo que não havia nem superpopulação e nem risco de febre maculosa. Passados sete anos, percebe-se que os técnicos estavam certos, pois não houve caso da doença em Rio Preto.

Munícipes tentando contemplar as capivaras
O caso das capivaras na cidade é um grande exemplo de como podemos conviver em harmonia com os animais. As pessoas se acostumaram a apreciar e respeitar os bichos. É comum ver famílias fotografando os animais. Não há um único registro de transmissão de doença ou de ataque em mais de uma década de convívio. Os problemas registrados até o momento referem-se apenas a atropelamentos de pouquíssimos animais, sendo que a prefeitura não tem levantamento preciso das ocorrências. O cercamento das margens da Rodovia BR-153, exigido pelo IBAMA em 2005, atenuou consideravelmente o problema. No caso da rodovia o cercamento era necessário, pois se trata de uma via de fluxo rápido. A solução para eventuais atropelamentos nas vias urbanas passa por uma política de trânsito para o local que contemple a limitação da velocidade, a sinalização e orientação dos motoristas e uma fiscalização eficiente. Qual é o problema em se andar a uma baixa velocidade em um lugar que deveria ser de contemplação e eventualmente parar o carro para dar passagem aos animais, como ocorre em muitos parques espalhados pelo mundo?

Como são roedores aquáticos, as capivaras não ficarão limitadas pela cerca. Impedidas de se alimentar nos locais cercados a tendência é que elas migrem pela água até outros pontos de alimentação, podendo causar problemas muito maiores ao ocupar áreas onde as pessoas não estão acostumadas com suas presenças. A cerca instalada pela prefeitura, além de ser de extremo mau gosto do ponto de vista estético, rompe a integração homem/ambiente, transformando a situação em algo parecido com um zoológico, onde as pessoas são meros espectadores da natureza e não parte dela. Isso é prejudicial no aspecto educativo e reforça a crença de que temos que viver apartados do mundo natural, o que é hoje uma das maiores causas dos problemas ambientais.

Cidadão alimentando os gansos e consequentemente
os pombos domésticos, com migalhas de pão
Não há superpopulação de capivaras na represa. O que ocorre é que os animais estão acostumados com a presença humana e, portanto, não fogem. Assim vemos muito mais capivaras na represa do que em ambientes naturais, onde os bichos se escondem. Ao contrário de outros animais que aumentam sua população beneficiados por restos de comida, lixo ou até fornecimento deliberado de alimento por parte das pessoas, como gatos, cães, pombos e pardais, as capivaras comem gramíneas, que têm sua distribuição limitada na represa às áreas não edificadas ou pavimentadas. As pessoas costumam pensar que apenas os predadores são responsáveis pelo controle populacional de herbívoros, mas a disponibilidade de alimentos é um importante fator limitante. Assim não há como haver aumento da população acima da capacidade do ambiente em fornecer alimento. Ninguém leva feixes de capim à represa para alimentar capivaras e por isso não há um input de alimentos capaz de manter uma população acima da capacidade suporte do meio.

Pombos domésticos comendo pão fornecido por
frequentador da represa
Ao contrário de se preocupar em prejudicar as capivaras, que pertencem à fauna nativa, embelezam a represa e ensinam o homem a ter respeito para com os animais silvestres, a prefeitura deveria manter guardas ambientais, monitores ou qualquer outro tipo de servidor que pudesse monitorar a interação das capivaras com as pessoas, evitando eventuais problemas, mas que agissem principalmente para coibir comportamentos graves que estão acontecendo à luz do dia sem que qualquer providência seja tomada. Em algumas horas que estive na represa para fazer as fotos que ilustram este artigo, observei um senhor distribuindo pães aos patos e gansos, que acabavam sendo consumidos muito mais pelos nocivos pombos domésticos do que pelas aves aquáticas. O local também há muito tempo virou ponto de abandono de gatos e igualmente constatei pessoas distribuindo ração aos felinos, que além de predarem as aves nativas, transmitem uma infinidade de doenças. Eu pergunto: o que a municipalidade está fazendo para combater esse problema? Casos de zoonoses afetando humanos a partir de pombos domésticos e gatos estão fartamente documentados na cidade, mas o prefeito e o secretário do meio ambiente priorizam um desnecessário controle da população de capivaras e permitem que as pessoas sustentem grandes populações de animais nocivos por meio daquele tipo de boa intenção da qual o inferno está cheio.

Pessoas alimentando gatos no parque da
represa

Após a polêmica instalada, prefeito e secretário soltaram uma pérola: a provável castração dos machos dominantes. Ora, o que faz um macho ser dominante no grupo são características que se manifestam por meio da ação hormonal que será suprimida com a castração. Assim, o macho deixará de ser dominante. Estudos em populações manejadas de capivara mostram que a supressão de um macho dominante leva a um caos inicial no grupo causado pela disputa entre os outros machos em busca do maior posto hierárquico e da aceitação das fêmeas, que acaba estabilizada com o estabelecimento de um novo macho dominante. Então o prefeito terá que castrar todos os machos e consequentemente exterminar as capivaras da represa.

Toda essa demonstração de despreparo na gestão ambiental de Rio Preto teria sido evitada esse houvesse maior transparência e democracia na administração. Pelo que se observa em consulta ao site do Conselho de Meio Ambiente do Município, percebe-se que o mesmo não se reúne há mais de seis meses. A atuação do colegiado tem sido pífia. Por que o secretário não consulta a sociedade, representada no conselho, antes de sair tomando atitudes completamente desprovidas de fundamentação técnica?

Árvores cortadas na margem da rodovia
Washington Luís
A imprensa noticiou no dia de hoje um total descaso com a proteção dos mananciais da cidade. Os pombos e gatos proliferam na represa. Árvores são sumariamente suprimidas às margens do Rio Preto, para dar lugar a um “parque”, e da rodovia Washington Luís, para dar mais espaço aos carros, alvo de grande preocupação da municipalidade desde 1972, quando foram protegidos do cocô das andorinhas. Mas a prioridade é o combate às capivaras. Eu seria a favor de uma castração que impedisse a reprodução de políticos que tomam decisões como essa, ao invés da que visa privar a represa de um de seus mais belos atrativos.


Patos atravessando rua

domingo, 15 de julho de 2012

Desindustrialização brasileira: mito ou fato?


Por Joaquim Maia Neto
O Brasil passa por um momento de ameaça à indústria nacional. Não se trata apenas de uma hipótese remota, ou de um mito, como muitos advogam. Os números corroboram o enfraquecimento do setor industrial, consequência de uma conjuntura global na qual outras atividades econômicas expandem sua participação no mercado. A situação é agravada pela acirrada competição com países nos quais a indústria é beneficiada por políticas públicas que lhe conferem vantagens em relação à indústria brasileira.
Muitos fatores têm levado à progressiva desindustrialização no nosso país. Quase todos agem reduzindo a competitividade brasileira no mercado global. Câmbio desfavorável, alta carga tributária, infraestrutura precária, encargos trabalhistas incompatíveis com as atuais exigências do mercado, juros elevados e custo dos insumos estão entre as principais causas das dificuldades que este importante setor da economia enfrenta atualmente. Nem mesmo a abundância de recursos naturais disponíveis no Brasil, que podem ser convertidos em matéria prima para a indústria, é capaz de amenizar os efeitos negativos do extenso rol de fatores prejudiciais.
Dentre todas as dificuldades, duas são decisivas e devem ser enfrentadas imediatamente: a infraestrutura logística e o câmbio. A primeira delas faz com que o custo de deslocamento represente um percentual alto na composição dos preços dos produtos finais. Para saná-la são necessários altos investimentos, que podem ser realizados diretamente pelo poder público ou em parceria com o setor privado, na forma de concessão de parte da cadeia logística à iniciativa privada. Nessa frente de ação devem ser priorizados os investimentos nos modais ferroviário e aquaviário de transportes, que são menos onerosos, devido aos ganhos de escala, e ainda garantem vantagens ambientais.
A questão do câmbio é um problema cuja solução é complexa, pois não depende exclusivamente de ações do governo brasileiro. A China, por exemplo, vem mantendo sua moeda artificialmente subvalorizada, com o evidente propósito de garantir competitividade às suas exportações de produtos manufaturados. Para compensar as perdas econômicas causadas pela política cambial chinesa, a União Européia e os Estados Unidos passaram a adotar medidas protecionistas que prejudicaram ainda mais a economia brasileira. Neste contexto, não há alternativa ao Brasil que não seja seguir o mesmo caminho, ou seja, adotar também ações no sentido de proteger a economia nacional, em especial o setor industrial.
A presidente Dilma Rousseff anunciou há pouco tempo, em recente reunião com grandes empresários brasileiros, medidas de proteção à indústria nacional. Consideradas tímidas por alguns analistas, as medidas têm ajudado a indústria na delicada conjuntura global atual.
Se ações protecionistas mais ousadas não forem implementadas, continuaremos a conviver com uma situação perversa, na qual, para manter a balança comercial com números positivos, o país acaba priorizando a produção de commodities primárias. Isso ocorre em detrimento da produção de bens manufaturados, que têm maior valor agregado. Gera-se, assim, um círculo vicioso que agrava a desindustrialização.
A defesa da indústria nacional, com a adoção de políticas públicas eficazes para o setor, é fundamental para que o sucesso econômico brasileiro se sustente no futuro. A desindustrialização é um problema real e deve ser enfrentado agora, sob pena de sermos os próximos expoentes de uma crise econômica.

domingo, 8 de julho de 2012

O Brasil é tricampeão! Um título para não comemorar.


Por Joaquim Maia Neto

Aniversários que completam décadas costumam ser mais comemorados. As pessoas parecem ter predileção por números “redondos”. Devido a essa predileção, importantes eventos ambientais têm acontecido em anos terminados em “2”, desde a Conferência sobre Meio Ambiente Humano, realizada pela ONU em Estocolmo, na Suécia, no ano de 1972. Vinte anos depois de Estocolmo tivemos a Eco 92, no Rio de Janeiro. Trinta anos depois, a Rio+10, em Johanesburgo. Quarenta anos depois, a Rio+20, que acabou de acontecer. Mas há um cinquentenário comemorado neste ano, muitíssimo importante, que muita gente desconhece ou esqueceu. Em 1962 foi publicado nos EUA o livro “Primavera Silenciosa”, de Rachel Carson, denunciando os malefícios dos agrotóxicos à saúde humana e à vida selvagem. A publicação do livro foi fundamental para o banimento do DDT nos Estados Unidos, dez anos depois.

Manifestação durante a Cúpula dos Povos.
Cinquenta anos depois do lançamento da obra que é considerada o marco impulsionador do ambientalismo e da luta contra os agrotóxicos em todo o mundo, o Brasil comemora o tricampeonato mundial de envenenamento. Segundo um estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), apresentado durante a Cúpula dos Povos pela pesquisadora da UFPE, Lia Giraldo da Silva Augusto, a venda de agrotóxicos no Brasil em 2010 teve um aumento de 190% em relação a 2009. Com este aumento o Brasil foi, pelo terceiro ano consecutivo, o maior consumidor de agrotóxicos do planeta, de acordo com dados levantados pela ANVISA. Esse tricampeonato não tem nada de glorioso. É motivo de vergonha para o país e é sintomático da realidade do agronegócio brasileiro que não tem nada de sustentável, ao contrário do que afirma a Confederação Nacional da Agricultura.

O consumo de agrotóxicos no Brasil chegou ao alarmante número de 5 Kg por habitante/ano. É muito veneno! Essa situação é fruto de um modelo de agricultura perverso, que condena a saúde dos trabalhadores rurais, dos consumidores e dos ecossistemas em benefício do lucro de poucos. A destruição do ambiente natural torna a produção agrícola cada vez mais dependente dos defensivos químicos, que por sua vez agravam o desequilíbrio ambiental, formando um círculo vicioso.

Falta ao Brasil uma política pública que crie condições para que os pequenos agricultores possam produzir alimentos sadios para a população, com incentivo à agricultura familiar e ao respeito à natureza e aos conhecimentos tradicionais. O montante de recursos aplicados em benefício dos pequenos produtores e da agricultura orgânica é várias vezes menor do que os incentivos voltados ao agronegócio, que incluem financiamentos facilitados e redução na tributação, inclusive dos agrotóxicos.

http://agriculturafamiliarater.blogspot.com.br/
O uso maciço de veneno nas lavouras brasileiras tem sujeitado a população a doenças diversas, muitas vezes não diagnosticadas. Até mesmo os agrotóxicos de uso permitido, mesmo quando aplicados nas doses aceitáveis, podem prejudicar a saúde das pessoas que consomem os produtos nos quais eles foram utilizados. A situação se torna mais grave porque no Brasil infelizmente ainda é frequente o uso de substâncias proibidas e a utilização das permitidas em quantidades superiores às autorizadas. Os problemas que o envenenamento dos alimentos causa às pessoas variam desde simples irritação até tumores malignos. Na maioria das vezes não se faz a associação do problema com o consumo de alimentos contaminados, pois faltam estudos nesse sentido. De que adianta fazermos campanhas para que as pessoas cuidem melhor de sua saúde, comendo mais vegetais, se eles estão envenenados?

O preço dos produtos orgânicos ainda é muito mais caro do que os “convencionais”, assim chamados aqueles cuja produção utiliza agrotóxicos. As pessoas mais pobres não têm a opção de comprar um produto mais saudável e justamente elas têm maior dificuldade de obter atendimento médico, pois dependem do nosso precário sistema de saúde pública. Configura-se assim uma grande injustiça social, pois os que menos podem se tratar são os que mais se contaminam.

Horta pública em Todmorden, Reino Unido.
Pequenas ações podem ajudar na solução parcial do problema. Uma reportagem recente exibida na Rede Globo mostrou o caso da cidade de Todmorden, no interior da Inglaterra, onde espaços públicos foram transformados em hortas socializadas, onde qualquer um pode plantar e qualquer outro pode colher. Com a iniciativa as pessoas passaram a ter acesso a vegetais saudáveis para sua alimentação. Isso pode ser uma solução adequada para cidades pequenas, mas não resolve o problema da maioria da população que se concentra nos grandes centros urbanos que não tem como produzir alimentos localmente. A verdadeira solução passa por uma ruptura do nosso modelo de agricultura e pela implantação de sistemas de produção mais harmônicos com a natureza. Essa harmonia pode estar na agricultura familiar, onde o homem trabalha a terra compreendendo o valor da natureza e dedicando o respeito que ela merece.

Um bom começo para o Brasil seria estabelecer uma meta de redução no consumo de agrotóxicos e implantar políticas para alcançar essas metas. Deveríamos ser campeões de produção alimentos saudáveis ao invés de liderarmos a lista dos contaminadores do planeta.


Veja também: O veneno nosso de cada dia

domingo, 1 de julho de 2012

Da Rio+20 às sacolinhas paulistas: estamos longe da verdadeira sustentabilidade


Por Joaquim Maia Neto

Encerrada a Rio+20, as avaliações são distintas. Para os pessimistas, o fracasso previsto da Conferência se concretizou. A incapacidade dos governos em encontrar uma solução consensual para os maiores problemas ambientais e sociais da humanidade foi refletida em um documento pobre, no qual os poucos compromissos assumidos são absolutamente insuficientes para fazer frente aos desafios que enfrentaremos. Como esperado, os representantes das nações que subscreveram o documento final, denominado “O Futuro que Queremos”, não foram audaciosos a ponto de mostrar ao mundo um caminho de mudanças cujo horizonte temporal fosse compatível com a rapidez necessária para reverter, ou no mínimo mitigar, os prejuízos que as agressões ao planeta causarão a todos os seus habitantes.

Tradução: "Não tenho tempo..."
Os otimistas se apegam aos resultados da “Cúpula dos Povos”, um evento paralelo da sociedade civil, e às centenas de compromissos voluntários entre governos, ONGs e empresas, para anunciar que nem tudo está perdido. Na avaliação otimista, a capacidade de articulação da sociedade demonstraria que há uma consciência global que exige mudança nos rumos da atual sociedade de consumo, pautada pelo capitalismo insustentável.

A comparação entre os resultados da Cúpula dos Povos e da conferência oficial apenas demonstram o abismo que existe entre as duas visões de mundo. Estamos muito distantes de alcançar resultados compatíveis com aquilo que os movimentos sociais esperam dos governos nacionais. Um exemplo é o conceito de “Economia Verde”, um dos eixos principais da conferência oficial, que não passa de uma nova maquiagem que o sistema capitalista encontrou para continuar sobrevivendo, e que foi duramente criticado no documento final da Cúpula dos Povos.

Lamentavelmente temos que admitir que os pífios resultados da Rio+20 refletem exatamente a opinião da maioria da população mundial. Não podemos acusar os chefes de Estado de não representarem seus povos. Vejamos o que acontece no Brasil. Nem bem terminou a conferência e acaba de ser publicada a Lei12678, que desafeta áreas de unidades de conservação da Amazônia para dar lugar a novas usinas hidrelétricas. Essa lei é de iniciativa de um governo que detém 77% de aprovação, segundo as mais recentes pesquisas.

Em São Paulo um histórico acordo entre o Governo do Estado e os supermercados, que baniu as nocivas sacolinhas plásticas, acaba de ser derrubado na justiça. A postura cômoda da maioria dos consumidores que, por preguiça de levar uma sacola retornável para suas compras, reclamou da suspensão na distribuição do lixo plástico, fez com que a justiça agisse totalmente na contramão da proteção do meio ambiente.

Tanto a alta aprovação de um governo desenvolvimentista a qualquer preço, quanto a choradeira causada pelo fim da distribuição das sacolinhas são demonstrações de como a sociedade majoritariamente não valoriza a questão ambiental. Portanto, não há que se falar que os governos representados na Rio+20 estão alheios aos anseios de seus povos.

As preocupações com a economia tradicional, com o crescimento do PIB, com a manutenção dos empregos e com a saúde das instituições financeiras ainda estão à frente da preocupação com a saúde do planeta na lista de prioridades da sociedade mundial. É por isso que governantes adotam essa postura irresponsável na área ambiental. Repercutem a postura também irresponsável de seus representados.

Muitas vezes os ambientalistas, por conviverem em meio a seus pares, não percebem que falam para si mesmos e que há muito a ser transformado na sociedade. Infelizmente os participantes da cúpula dos povos, apesar de muito responsáveis e preocupados com o que realmente interessa, estão longe de representar a maioria das pessoas. Se seus interesses fossem majoritários, teríamos governos com as mesmas preocupações. Vejam a conduta dos políticos mais votados. Poucos têm compromisso com o meio ambiente. É verdade que as corporações têm maior poder de influência sobre os governos do que tem o povo. Mas elas não agem influenciando apenas o governo, mas exercem influência também sobre as pessoas.

As condutas ambientalmente corretas, ainda que minimamente, continuam sendo consideradas “radicais” e “xiitas” por parte de amplos segmentos da sociedade. Basta sair do meio “ambientalista” para perceber isso. Ainda somos considerados chatos por muitas pessoas quando recomendamos menos consumo ou o uso da sacola retornável, do transporte coletivo, da bicicleta, da ventilação natural.

Continuar brigando com governos é necessário, mas o movimento ambientalista tem a árdua tarefa de convencer corações e mentes de que o mundo vai mal e que é preciso mudar os rumos. Uma coisa é fazer uma pesquisa de opinião e constatar que a maioria dos brasileiros era contra as mudanças no Código Florestal, por exemplo. Outra coisa são as atitudes dessas mesmas pessoas que rejeitavam as mudanças. Será que elas abrem mão dos confortos propiciados pela sociedade de consumo em benefício de um futuro melhor e da redução das desigualdades sociais? Provavelmente não. E os governos sabem disso. Tanto que a Dilma não vetou integralmente o Código e sua popularidade não só não caiu, como aumentou.

Passe quinze minutos na porta de um supermercado. Veja os consumidores felizes da vida carregando quinquilharias acondicionadas em muitas embalagens, dentro das sacolas plásticas, sem nenhum remorso e digam quantos realmente estão preocupados com o documento da Cúpula dos Povos. Temos muito trabalho pela frente.

domingo, 24 de junho de 2012

A lei da anistia que matou o Código Florestal

Por Joaquim Maia Neto

A luta contra o retrocesso ambiental caracterizado pelas alterações no código florestal brasileiro ainda não acabou. Estão enganados os que pensam que os vetos feitos pela Presidente da República, associados à edição da Medida Provisória n° 571/2012, resolveram o problema e encerraram a polêmica. Muitos aspectos ainda serão debatidos no Congresso e é preciso que a sociedade saiba o que realmente aconteceu e que continue acompanhando a questão, pois a Lei que entrou em vigor após sanção presidencial é muito ruim e ainda pode piorar.  Leia mais...
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*Publicado originalmente no site da  Regional Latinoamericana de la Unión Internacional de trabajadores de la Alimentación, Agrícolas, Hoteles, Restaurantes, Tabaco y Afines (Rel-UITA) - http://www.rel-uita.org

domingo, 17 de junho de 2012

O clima não é dos melhores


Por Joaquim Maia Neto

Apesar de não estar entre os temas principais da Rio + 20, a questão do clima não ficou de fora da agenda da Conferência, pois, nos dias atuais,  não há como discutir desenvolvimento sustentável, economia verde ou governança ambiental, passando à margem das mudanças climáticas.

Entre os eventos paralelos que estão acontecendo no Rio de Janeiro, destaca-se o Rio/Clima (Rio Climate Challenge), que discute soluções para o problema das mudanças climáticas. É irônico observar que, durante a realização do evento, o Brasil enfrenta inundações imensas em cidades amazônicas e uma seca desastrosa no sertão nordestino.

Seca no Nordeste
http://lajespintadasemfoco.blogspot.com.br
Os prejuízos econômicos causados pelas mudanças climáticas já estão sendo sentidos com grande intensidade. O Congresso Nacional está analisando a Medida Provisória 565/2012 que autoriza o governo a instituir linhas de crédito voltadas para os municípios em situação de emergência ou em estado de calamidade pública, com a finalidade de mitigar os efeitos da seca e das enchentes. Os parlamentares querem incluir na MP a renegociação das dívidas e o perdão dos juros aos agricultores que tiveram prejuízos causados pelo clima. Aí temos mais uma ironia, pois, segundo dados de 2010 do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, 55,6% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa (GEE) são oriundas da mudança no uso da terra e florestas, atividades tipicamente ligadas ao agronegócio. Isso quer dizer que o governo adota uma política pública que protege dos efeitos prejudiciais das mudanças climáticas justamente aqueles que são responsáveis pelo seu agravamento. É claro que no universo dos beneficiados há pequenos agricultores que pouco contribuem para as emissões, mas é interessante ver que o setor econômico do país que mais afeta o clima é o que mais sofre as consequências das mudanças, demandando o socorro governamental.

Não podemos esquecer que nossas atitudes e principalmente nossos hábitos de consumo são os maiores responsáveis pelo aquecimento global. Nossas viagens ajudam a aquecer o planeta e consequentemente a alterar negativamente o clima. As viagens aéreas são responsáveis por 2% de todas as emissões de GEE do mundo. Dados da Agência Ambiental Federal Alemã demonstram que cada passageiro de avião é responsável pela emissão de 370 g de CO2 por Km. Se a viagem for feita de carro, a emissão cai para 150 g/Km. De trem e de ônibus as emissões são as menores (50 e 30 g/Km por passageiro, respectivamente). Quase tudo o que compramos gera emissão de carbono, portanto, quanto mais consumimos, mais contribuímos com o efeito estufa e mais sofreremos as conseqüências. São hipócritas as estratégias de marketing utilizadas por algumas empresas que afirmam que produzem determinado tipo de produto com emissão zero. Não há espaço para se plantar árvores suficientes de maneira a neutralizar todas as emissões geradas no atual padrão de produção e consumo da humanidade. A única solução é crescer menos, ou decrescer, o que não significa menos desenvolvimento, e consumir menos.

O modelo de desenvolvimento econômico baseado no constante crescimento do PIB é incompatível com ações voltadas à mitigação das mudanças do clima. Todos os esforços no sentido de reduzir as emissões acabam sendo anulados pela política de crescimento constante, lastreada no crescimento do consumo. Por isso, os participantes da Rio Climate Challenge, propõem a transformação do conceito de PIB, que hoje usa apenas a soma de bens e serviços produzidos no país para medir sua riqueza. A proposta em discussão é a de que se incluam variáveis ligadas à sustentabilidade no conceito de PIB.

Enchente em Coari - AM
http://prelaziadecoari.blogspot.com.br
No enfrentamento das mudanças climáticas devem ser adotadas estratégias nas mais diversas áreas. No setor energético é preciso eliminar gradativamente a geração por meio de combustíveis fósseis. Os subsídios a esse tipo de combustível devem ser extintos. Os investimentos deveriam ser maiores no setor de biocombustíveis, mas não é isso o que está acontecendo no Brasil. Em plena realização da Rio + 20, a Petrobrás anunciou seu novo plano de negócios para o período de 2012 a 2016, que prevê aumento nos investimentos voltados à produção de combustíveis fósseis (petróleo e gás) e redução em termos percentuais dos investimentos em etanol e biodiesel.

O investimento em transporte coletivo público também é importante no combate às emissões, mas no Brasil continuamos aquecendo a economia com isenções tributárias nos automóveis, estimulando o aumento da frota com o consequente aumento no consumo de combustíveis.

Não adianta sediar a Rio + 20 e continuar adotando políticas públicas incoerentes com as necessidades de redução das emissões. O Brasil não resolverá sozinho o problema climático do planeta, mas tem todas as condições de ser referência para o mundo no combate às mudanças do clima. No discurso da Presidente da República na abertura da Rio + 20, percebe-se uma ênfase muito maior na questão econômica e no crescimento, do que na preocupação com o meio ambiente equilibrado. Parece que o governo ainda não internalizou nas suas decisões o cerne da discussão ambiental. A estratégia de cobrar dos países ricos apoio financeiro às boas iniciativas dos países pobres parece inócua no atual momento de crise. Talvez seja melhor pressioná-los a resolver seus próprios problemas, reduzindo suas emissões. A solução para a questão climática passa pela adoção de metas ousadas de redução de emissões por parte da China, EUA, Índia, Rússia, Japão e União Europeia. Sem o compromisso desses países, não há perspectiva otimista.