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domingo, 22 de janeiro de 2012

Histórico e considerações sobre auditoria ambiental

Por Joaquim Maia Neto

O surgimento das auditorias ambientais
Muito se discute a questão das auditorias ambientais nos empreendimentos potencialmente poluidores, em especial a obrigatoriedade de sua realização, ou seja, a chamada auditoria ambiental compulsória.
As auditorias ambientais surgiram no final da década de 70 nos Estados Unidos da América, onde as empresas as adotaram voluntariamente como uma ferramenta de gerenciamento para identificar antecipadamente os problemas causados por suas operações. As auditorias eram vistas como uma forma de reduzir custos com eventuais correções onerosas. Submetendo-se às auditorias, as empresas se preparavam para as inspeções da Environmental Protection Agency – EPA.
A Holanda foi o primeiro país da Europa onde as empresas passaram a adotar as auditorias na gestão ambiental. A iniciativa, ocorrida em 1985, partiu de filiais de empresas estadunidenses, a exemplo do que aconteceu nos demais países nos quais a prática se expandiu. Apesar das auditorias ambientais terem sido criadas nos EUA, a primeira norma de sistema de gestão ambiental que estabeleceu parâmetros para a execução de auditorias foi criada em 1992 no Reino Unido, a BS 7750, que foi baseada em uma norma pré-existente de sistema de gestão de qualidade (BS 5770). Iniciativa semelhante aconteceu na França e posteriormente a Comunidade Econômica Europeia adotou regulamento que entrou em vigor em 1995 criando o Environmental Management and Auditing Scheme – EMAS.
Internacionalmente a normalização de auditorias ambientais ocorreu no âmbito da International Organization for Standardization – ISO. No Brasil a normalização se deu em 1996 por meio da apresentação, pela ABNT, das NBR ISO 14010, 14011 e 14012. Atualmente está em vigor a NBR ISO 19011, de 2002.
Em praticamente todo o mundo as auditorias ambientais são voluntárias. As empresas que delas se utilizam costumam adotar o chamado “marketing verde” e precisam demonstrar aos seus consumidores e clientes que realmente dispõem de um processo produtivo que atende às conformidades ambientais e respeita o meio ambiente. As auditorias independentes são uma forma de comprovar aquilo que elas divulgam em sua publicidade. As relações com as instituições governamentais fiscalizadoras acabam melhorando, o que evita ou reduz as sanções administrativas ou penais e as reparações por danos causados ao meio ambiente e a terceiros. Nenhuma das normas internacionais, bem como aquelas surgidas inicialmente na Europa jamais obrigaram as empresas a realizarem auditorias ambientais. Apenas estabeleciam parâmetros de como proceder no caso de optarem pela realização das auditorias.
Auditoria ambiental compulsória no Brasil
Ao contrário do que ocorre nos sistemas de regulação ambiental dos demais países que os possuem com estrutura pelo menos razoável, no Brasil diversas iniciativas têm sido adotadas pelo poder público no sentido de transformar a auditoria ambiental num procedimento compulsório. A primeira vez que um empreendimento foi obrigado a realizar auditoria ambiental no Brasil foi em 1990, quando uma resolução do CEPRAM - Conselho Estadual de Proteção Ambiental da Bahia determinou, por ocasião da emissão da licença de operação para uma indústria de celulose, que o empreendedor realizasse auditoria para verificação do cumprimento das condicionantes da licença.
A primeira iniciativa legislativa de auditoria ambiental compulsória partiu do município de Santos-SP, com a publicação da Lei 790, de 5/11/1991. O primeiro estado que legislou no mesmo sentido foi o Rio de Janeiro, que no mesmo ano publicou a Lei 1898, de 16/11/1991. A partir de então outros estados passaram a obrigar diversos tipos de empreendimentos potencialmente poluidores a realizar auditorias ambientais no âmbito do processo de licenciamento ambiental. Atualmente há auditoria ambiental compulsória nos sistemas de licenciamento de sete estados brasileiros: Rio de Janeiro (1991), Minas Gerais (1992), Espírito Santo (1993), Mato Grosso (1995), São Paulo (1997), Paraná (2002) e Santa Catarina (2009).
Na esfera federal a primeira discussão no sentido de se estabelecer auditoria compulsória se deu no âmbito do Projeto de Lei nº 3160/1992, do então deputado Fábio Feldmann, à época no PSDB-SP. Histórico militante da causa ambiental, Feldmann foi em 1986 o primeiro parlamentar brasileiro a ser eleito com uma plataforma ambientalista e foi também o responsável pela inclusão do capítulo sobre meio ambiente na Constituição Federal de 1988. Por meio de seu projeto, o deputado tentou inserir na Lei 6938/1981 a auditoria ambiental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, tornando-a obrigatória para os empreendimentos potencialmente poluidores. Aprovado na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias (CDCMAM), o PL teve parecer contrário do relator na Comissão de Economia, Indústria e Comércio (CEIC), o deputado Sandro Mabel, hoje no PMDB-GO. O parecer do relator não chegou a ser votado na comissão. Em 1998 o deputado Feldmann não conseguiu sua reeleição e o projeto foi arquivado em fevereiro de 1999.
O primeiro ato normativo a vigorar estabelecendo auditoria ambiental compulsória foi a Resolução CONAMA 265, de 27/1/2000, motivada pelo acidente da Petrobrás na Baía de Guanabara. A resolução obrigava a estatal a realizar auditorias ambientais em todas as suas instalações localizadas no Estado do Rio de Janeiro. Em abril do mesmo ano foi publicada a única lei federal que estabelece auditoria ambiental compulsória. A Lei 9966, de 28/4/2000, que dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional, determina, em seu artigo 9º, que “As entidades exploradoras de portos organizados e instalações portuárias e os proprietários ou operadores de plataformas e suas instalações de apoio deverão realizar auditorias ambientais bienais, independentes, com o objetivo de avaliar os sistemas de gestão e controle ambiental em suas unidades”. Portanto, no Brasil de um modo geral, apenas empreendimentos portuários e de exploração de petróleo e gás natural estão sujeitos à auditoria ambiental compulsória. Como os estados podem ter legislação própria mais restritiva que a federal, nos sete estados citados o rol de empreendimentos sujeitos à obrigação é bem maior.
Em 2002 o CONAMA estabeleceu, por meio da Resolução 306, de 5/7/2002 (alterada pela Resolução CONAMA nº 381/2006), os requisitos mínimos e o termo de referência para a realização de auditorias ambientais com foco no atendimento ao disposto na Resolução 265 e no artigo 9º da Lei 9966.
No Congresso Nacional a discussão sobre a obrigatoriedade das auditorias ambientais não cessou com a regulamentação para os setores portuário e petrolífero. Dois projetos praticamente idênticos ao do deputado Fábio Feldmann foram apresentados em 2003. Um deles, o PL 1254/2003, de autoria do deputado César Medeiros (PT-MG), apesar de contar com parecer favorável do deputado Rubens Otoni (PT-GO), relator na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio (CDEIC), foi rejeitado na Comissão, que não acatou o voto do relator. O projeto foi arquivado definitivamente em janeiro de 2007 em decorrência da não-reeleição do autor. O outro projeto (PL 1834/2003) teve como autor o deputado Antônio Carlos Medes Thame (PSDB-SP), que requereu seu arquivamento em 2007.
É conveniente estabelecer auditorias ambientais compulsórias?
É praticamente um consenso entre os países desenvolvidos a defesa do caráter voluntário das auditorias ambientais. Seus defensores argumentam que a obrigatoriedade inibiria o desenvolvimento desse instrumento de gestão ambiental e perturbaria as relações entre auditor e auditado, levando à sonegação de informações por parte deste. Propugnam por um sistema de incentivo aos empreendedores como forma de motivá-los a aderir voluntariamente às auditorias. Exemplos de incentivos seriam a agilização do licenciamento ambiental, a menor frequência nas fiscalizações e a não imputação de penalidades quando não-conformidades forem informadas à entidade reguladora e corrigidas espontaneamente pelo empreendedor, por exemplo. O sistema, que parece funcionar bem na Europa, EUA e Canadá, não foi suficiente para evitar o desastre do Golfo do México, causado pela British Petroleum em 2010. No Brasil a auditoria compulsória também não evitou o acidente da Chevron no ano passado.
O Brasil tem uma realidade muito distinta dos países que adotam a auditoria voluntária. Nesses países a adesão à auditagem ambiental voluntária é grande porque as entidades fiscalizadoras são eficazes e punem severamente os empreendedores pelas infrações que geram impactos ambientais. Dessa forma a auditoria leva a empresa a economizar recursos, pois antecipa a solução do problema para quando este ainda não causou grandes danos. É mais barato do que pagar as pesadas multas, responder processos penais e arcar com a reparação cível dos prejuízos.

Fonte: http://www.eventosdebiologia.blogspot.com/

No Brasil, praticamente ninguém paga as multas ambientais. Os processos na justiça se arrastam por anos a fio e quase nunca a pessoa dos empresários é responsabilizada pelos danos causados pela sua empresa. É pratica comum não internalizar os custos das externalidades negativas causadas pela atividade econômica. Nesse contexto a auditoria ambiental é vista como um ônus ao empreendedor e não como uma oportunidade de economizar e se proteger de sinistros que poderiam comprometer a saúde financeira da empresa em um ambiente regulatório eficaz. Poucas empresas enxergam na auditoria uma forma de melhorar sua imagem junto ao consumidor e angariar novos nichos de mercado. Tais problemas, aliados a um sistema público de gestão ambiental altamente deficiente, largado ao sucateamento e sujeito a ataques do próprio governo, que desmantela gradativamente o aparato ambiental federal, tornam a auditoria ambiental compulsória um mecanismo necessário à realidade brasileira, como forma de viabilizar resultados minimamente aceitáveis na regulação ambiental.
Em 1992 o deputado Fábio Feldmann já sabia disso. Articulado com o que se passa no mundo em relação ao meio ambiente, não iria propor uma jabuticaba, sabendo que o mundo todo já adotava a auditoria voluntária, se o Brasil não precisasse da compulsória.
Talvez, num futuro próximo, após o desenvolvimento de uma ampla cultura de responsabilidade empresarial no país, poderíamos migrar para o sistema voluntário. A própria EPA estadunidense adotou o modelo compulsório entre 1980 e 1981 e depois passou para o modelo voluntário com incentivos. Não é por acaso que os estados brasileiros que têm os sistemas de licenciamento mais eficazes dispõem de legislação que torna compulsória a auditoria ambiental.

Um comentário:

  1. Excelente resumo do tema. Abordagem direta e prática. Parabéns pelo texto.

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